Tarde de Abril

Nada mudou, embora nada mais seja como antes. O rumo incerto da vida cortou todos os fios que pensei ter laçado seguramente em nossa existência. Virgínia, seu nome era Virgínia. E o seu sorriso... A mais linda poesia bordada em cada entranha do meu ser. Mas o tecido fino dessa vida resolveu levá-la para um canto qualquer, seu triste fim, terminar enterrada sob a terra seca, enfim molhada pelas lágrimas sofridas para cair nessa sua morada. O tempo foi difícil. A casinha de taipa deixada por minha avó, afastada da estrada, do mundo, me serviu para emergir, respirar depois do profundo mergulho na dor, mas continuo dentro de suas águas, as vezes nado, as vezes desejo definitivamente me afogar. Nunca encontrei as palavras certas e tomado por este torpor tento existir de forma lúcida, embora o desvio da realidade me acomodou desde aquela triste tarde de abril. Vez e outra um parente aparece por aqui com receio, medo de como, dessa vez, possa me encontrar. E assim estou, balançando a cadeira com os pés descalços, olhos fixos para qualquer nada que chame a minha atenção. Costumo levar flores à Virgínia, e com o coração pulsando fraco enfeito o seu túmulo pequeno, tal como era ela. Deito ao lado da terra já baixa, e me imagino ali, enfim ao seu lado, e voltando para casa renovo as esperanças de poder estar com ela. O passar dos anos em nada modificou em minha memória a sua imagem, aquela flor, que mesmo em terra árida nunca murchou, floriu meu viver e hoje, o meu olhar envelhecido ainda se enxerga em seus olhos. Quando a noite chega, só rezo por ela, a lamparina acesa lança sombras nas paredes, mas o que me assusta é o silêncio. Com a luz de um novo dia, me deixo esperar, na sala observo os retratos amarelos... Vagueio o olhar, no teto as teias de aranha me lembram o esquecimento, e em uma prece silenciosa peço à Deus o término desses velhos dias tão meus, tão sozinhos. Partir será enfim, minha única alegria.